As descobertas e os mistérios do único cometa já visitado pela humanidade: 67P

Já tem muita gente ansiosa, separando uma boa roupa, para receber a visita do cometa C/2023 A3 (Tsuchinshan-ATLAS), que promete dar um show no céu noturno a partir deste mês. Mas 10 anos atrás, éramos nós que estávamos visitando um cometa. O 67P/Churyumov-Gerasimenko é o único cometa que já recebeu a visita de uma sonda espacial. A Missão Rosetta, que orbitou o cometa entre 2014 e 2016, fez desse viajante espacial, com formato de “pato de borracha”, uma celebridade astronômica e o cometa mais estudado da história, mas que não deixou de ser um intrigante corpo celeste.

O que torna o 67P tão especial a ponto de mobilizar uma equipe de cientistas para enviar uma sonda ao encontro dessa pedra de gelo espacial, está nos segredos que ela guarda sobre a formação do Sistema Solar e, quem sabe, até mesmo sobre a origem da vida na Terra!

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Nós humanos conhecemos o 67P em 1969, quando os astrônomos ucranianos Klim Churyumov e Svetlana Gerasimenko estudavam cometas no Observatório Astronômico da Universidade de Kiev. Churyumov, buscando o cometa Solà nas imagens capturadas por Gerasimenko, notou algo inusitado: um outro cometa, até então desconhecido, no cantinho de uma das fotos. Assim, seguindo a tradição, ele foi batizado com o nome dos descobridores, recebendo também a designação “67P”, por ser o 67º cometa periódico registrado.

[ Cometa 67P/Churyumov-Gerasimenko registrado através de um telescópio – Créditos: Gianluca Masi ]

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Os cometas periódicos são aqueles que retornam ao interior do Sistema Solar em menos de 200 anos. O 67P, por exemplo, leva apenas 6,4 anos para completar sua órbita, mas nem sempre foi assim…

Este cometa pertence à chamada “Família de Júpiter”, composta por cometas de curto período e baixa inclinação, cujas órbitas são moldadas pela poderosa gravidade do gigante gasoso. Estudos mostram que, antes de 1840, ele levava 8,5 anos para completar uma volta ao redor do Sol, passando a pelo menos 600 milhões de quilômetros de distância. No entanto, um encontro próximo com Júpiter naquele ano o trouxe para mais perto, alterando seu periélio para cerca de 450 milhões de quilômetros. Em 1959, outro encontro com Júpiter reduziu sua órbita para apenas 6,5 anos, com um periélio de 193 milhões de quilômetros do Sol.

[ Órbita do Cometa 67P/Churyumov-Gerasimenko – Créditos: Tomruen / wikimedia.org ]

Embora não apresente risco imediato para nosso planeta, essa nova trajetória o tornou um Objeto Próximo à Terra (NEO), desmentindo a ideia de que Júpiter apenas nos protege de colisões. Na verdade, o gigante gasoso às vezes até joga algum pedregulho em nossa direção. Mas no caso do Churyumov-Gerasimenko, essa influência gravitacional acabou sendo útil, porque transformou o 67P em um alvo ideal para uma missão espacial!

A missão Rosetta, lançada em 2004, tinha como objetivo estudar de perto o 67P, entrando em órbita do cometa e enviando uma sonda, a Philae, para pousar em sua superfície. Os cometas são como freezers que preservam praticamente intacto o material primordial que deu origem ao sistema Solar. Por isso, os cientistas estavam determinados a entender sua composição, estrutura interna, atividade e os mistérios de sua origem. 

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E a Rosetta não decepcionou! A sonda passou dois anos orbitando o 67P, enviando imagens espetaculares e dados científicos que revolucionaram nossa compreensão sobre os cometas. A missão revelou que o Churyumov-Gerasimenko é um objeto celeste complexo e dinâmico, com cerca de 4 quilômetros de  penhascos íngremes, crateras profundas, planícies poeirentas e jatos de gás que eram expelidos de sua superfície à medida que se aproximava do Sol.

[ Cometa 67P/Churyumov-Gerasimenko registrado pela Rosetta em 2015 – Créditos: Rosetta / ESA ]

Já em sua chegada, em 2014, os cientistas foram surpreendidos com seu formato de “patinho de borracha”. Imaginava-se que o “pescoço” do patinho poderia ter sido esculpido pelos jatos de gás e poeira que emanam do cometa. Mas os estudos mostraram que, na verdade, o 67P é um binário de contato, ou seja, um corpo celeste formado pelo impacto suave de dois outros corpos 

Entre as descobertas mais importantes da Rosetta, estão a presença de moléculas orgânicas complexas, como aminoácidos, que são os blocos de construção da vida! A missão também detectou água no 67P, mas com uma composição isotópica diferente da água encontrada nos oceanos da Terra, o que sugere que a água do nosso planeta pode ter vindo de outras fontes, como os asteroides hidratados.

A missão também revelou que o 67P tem uma densidade extremamente baixa, equivalente à metade da densidade da água! Isso significa que, se o cometa fosse colocado em uma banheira gigante, cheia de água, ele boiaria como um patinho de borracha… Mas também indica que nosso astro é poroso como uma esponja, composto de gelo de água, gases congelados e poeira, mas com grandes espaços vazios em seu interior.

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[ Cometa 67P/Churyumov-Gerasimenko em cores aproximadas – Créditos: Rosetta/ESA ]

E apesar de todas as descobertas da Rosetta, o 67P ainda guarda muitos mistérios! Ainda não sabemos ao certo como o cometa se formou, qual a origem da sua composição química e como seus jatos de gás são produzidos. Outro mistério são os “poços ativos” na superfície do 67P, grandes depressões que parecem estar expelindo material do interior do cometa. Tudo isso deixou os cientistas da Agência Espacial Europeia com um gostinho de quero mais!

[ Poeira e raios cósmicos na superfície do cometa em 2016, com estrelas se movendo ao fundo – Créditos: Rosetta / ESA ]

Não à toa, a agência está liderando a Missão Comet Interceptor, que deve ser lançada em 2029 e ficará esperando a passagem de um cometa de longo período, como o Tsuchinshan-ATLAS, mas que possa ser interceptado pela sonda antes de sua primeira aproximação do Sol. 

Mas enquanto aguardamos a próxima missão que nos levará para visitar um cometa, podemos apreciar daqui, a beleza e o mistério desses viajantes gelados que, de tempos em tempos, nos visitam e cruzam o nosso céu, nos lembrando da vastidão e da beleza do Universo que nos cerca.

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